ATA DA SEXTA SESSÃO SOLENE DA TERCEIRA SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA DA DÉCIMA LEGISLATURA, EM 02.04.1991.

 


Aos dois dias do mês de abril do ano de mil novecentos e noventa e um reuniu-se, na Sala de Sessões do Palácio Aloísio Filho, a Câmara Municipal de Porto Alegre, em sua Sexta Sessão Solene da Terceira Sessão Legislativa Ordinária da Décima Legislatura, destinada à entrega do Prêmio de Teatro Qorpo Santo à Atriz Carmem Silva, concedido através do Projeto de Resolução nº 25/88 (Processo n° 1315/88). Às dezessete horas e vinte e cinco minutos, constatada a existência de "quorum", o Senhor Presidente declarou abertos os trabalhos e convidou os Líderes de Bancada a conduzirem ao Plenário as autoridades e personalidades presentes. Compuseram a Mesa: Vereador Airto Ferronato, Vice-Presidente da Câmara Municipal de Porto Alegre; Senhor Rafael dos Santos, ex-Vereador deste Legislativo, proponente da solenidade; Senhora Judite Dutra, Primeira Dama do Município de Porto Alegre, representando o Prefeito Municipal; Professor Avelino Madalazzo, representando o Reitor da Pontifícia Universidade Católica; Ex-Vereadora Jussara Gauto; Senhora Carmem Silva, Homenageada; Vereador Artur Zanella, Secretário "ad hoc". Após, o Senhor Presidente pronunciou-se acerca da solenidade e registrou as presenças, no Plenário, dos Senhores Fernando Gonçalves do Nascimento, representando o Secretário de Recursos Humanos do Estado; Antônio Freitas, representando a Riocell e Edison dos Santos, representando o Deputado Tapir Rocha. Em prosseguimento, o Senhor Presidente concedeu a palavra aos Vereadores que falariam em nome da Casa. O Vereador Artur Zanella, em nome das Bancadas do PFL, PDS, PSB, PCB, PMDB, PTB, PDT e PL, registrou que a proposição da presente homenagem é de autoria do ex-Vereador Rafael dos Santos, discorrendo sobre o trabalho profissional da Senhora Carmem Silva e declarando ser ela um exemplo de "amor pela vida e pelo trabalho". E o Vereador Antonio Hohlfeldt, em nome da Bancada do PT, salientou a tradição cultural da Cidade de Pelotas, analisando a presença da Homenageada na história do teatro gaúcho e nacional. Ainda, defendeu a aprovação, pelo Congresso Nacional, de projeto da Deputada Beth Mendes, referente a regionalização dos meios de comunicação. A seguir, o Senhor Presidente concedeu a palavra à Atriz Carmem Silva, que agradeceu a homenagem prestada pela Casa e discorreu sobre a situação hoje apresentada pelo teatro gaúcho. Em continuidade, o Senhor Presidente convidou o ex-Vereador Rafael dos Santos a proceder à entrega do Prêmio de Teatro Qorpo Santo à Atriz Carmem Silva, e registrou correspondência recebida pela Casa com relação ao presente evento. Após, o Senhor Presidente agradeceu a presença de todos e, nada mais havendo a tratar, declarou encerrados os trabalhos às dezoito horas e cinco minutos, convocando os Senhores Vereadores para a Sessão Ordinária de amanhã, à hora regimental. Os trabalhos foram presididos pelo Vereador Airto Ferronato e secretariados pelo Vereador Artur Zanella, Secretário "ad hoc". Do que eu, Artur Zanella, secretário "ad hoc", determinei fosse lavrada a presente Ata que, após lida e aprovada, será assinada pelos Senhores Presidente e 1º Secretário.

 

 


O SR. PRESIDENTE: Srs. Vereadores, ilustres autoridades aqui presentes e srs. convidados, vamos dar início à Sessão Solene que concede o Prêmio de Teatro Qorpo Santo à Atriz Carmem Silva, Maria Amália Feijó.

Temos a satisfação de informar que está presente, representando o Secretário de Estado de Recursos Humanos e Modernização Administrativa, Dr. Luiz Alberto da Costa Chaves, o Dr. Fernando Gonçalves do Nascimento; está presente, representando a Riocell, o Sr. Antônio Freitas, que é Cidadão Emérito da Cidade de Porto Alegre; representando o Deputado Tapir Rocha, está presente Édison dos Santos.

Senhoras e senhores, os representantes do povo de Porto Alegre cumprem hoje uma justa homenagem à pelotense Maria Amália Feijó, que se tornou conhecida no cinema, teatro e televisão como Carmem Silva. Numa lembrança feliz e oportuna do Ver. Rafael Santos, da Legislatura anterior, da Bancada do PDS; a proposta da data de hoje é do Ver. Artur Zanella, e a Câmara de Vereadores desta Capital entrega o Prêmio Qorpo Santo a Carmem Silva. Trata-se do reconhecimento a uma atriz que elevou o prestígio da classe artística do nosso Estado, e, de modo particular, de Porto Alegre, completando 75 anos de idade na próxima segunda-feira, com 50 anos de profissão, a nossa homenageada é um exemplo de perseverança e verticalidade, a demonstrar que o espírito de trabalho e de empreendimento nunca pode parar. Carmem Silva continua com novos Projetos na sua atividade artística. Se mais não tem feito se deve à falta de incentivos às iniciativas dessa natureza, que relega a cultura a um plano secundário. Mas, ao receber o Prêmio Qorpo Santo, instituído em 1984 pela Câmara Municipal de Porto Alegre, acredito que estejamos, mais do que nunca, cumprindo com nossa tarefa de representantes da população da Capital gaúcha: a de homenagear uma pessoa que é um exemplo a ser seguido, especialmente nestes momentos de crise que estamos vivendo. Os Vereadores de Porto Alegre juntam-se a seus familiares, amigos e admiradores que Carmem Silva começou a ter desde o início de uma grande carreira, em 1939, na Rádio Cultura de Pelotas, para lhe desejar ainda muito êxito e sucesso nos palcos do teatro e da vida.

Nós convidamos o Vereador Artur Zanella para usar a palavra, em nome da sua Bancada, o PFL, e em nome das Bancadas do PDS, PSB, PCB, PMDB, PTB , PDT e PL.

 

O SR. ARTUR ZANELLA: Sr. Presidente em exercício da Mesa, Vereador Airto Ferronato; nossa homenageada Carmem Silva; o Sr. Adauto Santos; Dona Judite Dutra, Presidente do Mapa, representa, neste momento, o Sr. Prefeito Municipal; Dona Jussara Gauto, ex-Vereadora, que representa aqui a Assembléia Legislativa; representante do Secretário de Recursos Humanos do Estado, que, por sinal, é funcionário desta Casa, Sr. Fernando Gonçalves do Nascimento; Antônio Freitas, Cidadão Emérito de Porto Alegre, representante do Deputado Tapir Rocha; Avelino Madalozzo, representando a PUC; minhas senhoras e meus senhores. Na verdade quem deveria estar aqui, neste momento, fazendo o discurso era o Prof. Carlos Rafael dos Santos, Vereador desta Casa, e que, demonstrando que nem tudo é perfeito e que nem sempre a voz do povo é a voz de Deus, ele, nessa reviravolta toda que houve, o Prof. Rafael ficou como Suplente da Casa e pediu-me que solicitasse esta Sessão Solene, e hoje pediu-me que falasse também em seu nome. Eu queria dizer, parafraseando algo que eu li aqui, que eu sirvo hoje, como ocorre nos programas de televisão, nos humorísticos geralmente, eu hoje sirvo de escada, que é aquele coadjuvante, que é aquele que tenta fazer da melhor maneira o seu papel, faz o possível, mas não chega nunca ao brilho do ator principal. Então a minha função aqui era somente isso, ler alguma coisa do curriculum de Carmem Silva. Mas na verdade eu vou ler alguma coisa, mesmo dizendo que completa no dia de hoje, pelo que me parece, ao menos eu li na entrevista que deu, não sei quantos anos, e que começou jovem em Pelotas a sua carreira artística. Eu tento imaginar como é que ela chegou em casa e disse para a sua família que tinha sido contratada para ser artista de uma Companhia de Revistas ou Companhia de Teatro, Iracema de Alencar. Eu imagino, porque vejo como é que é hoje e imagino como seria naquela data. Diz o seu curriculum também, que depois das desventuras dessa Companhia, ela, em 1941, veio a Porto Alegre, contratada, reiniciar a sua carreira. Quero dizer para os senhores e senhoras, que vejo na Carmem Silva, a quem eu conheci há uns 10 anos atrás, um exemplo do gosto pela vida. É isto que eu queria ressaltar no dia de hoje, este amor pela vida, este amor pelo trabalho. Porque, coincidentemente, neste ano em que ela recomeçava a sua carreira, foi o ano do meu nascimento. E eu digo, Carmem, eu converso muito com meus colegas Vereadores, eu já estou cansado de tentar fazer coisas novas, de iniciativas, neste momento está esgotada. Cheguei a um processo que não estou pensando em fazer coisa nenhuma nova e vejo ela fazendo planos. Uma entrevista no jornal de hoje, propondo corpos de companhias de teatro, ressalvando que não é para emprego permanente, mas sim para cultura da nossa cidade e do Rio Grande do Sul. Depois continua a sua biografia que serviu para aprovação deste prêmio "Qorpo Santo", que foi o introdutor no Rio Grande do Sul e no Brasil, nosso Presidente Antonio Hohlfeldt saberá melhor do que eu isto, do teatro do absurdo, que é o teatro que às vezes pensamos estar participando de algumas reuniões em algumas sessões de debates. Nada de mais atual que Qorpo Santo e seu teatro do absurdo nesta situação em que vivemos neste País. Não se escuta em entrevistas de jornais e rádios uma palavra de otimismo, de alento, só se fala em recessão, em problemas e a Carmem Silva não, ela fala em futuro, em coisas belas e é por isto que estou falando hoje além daquilo que deveria falar. Depois, parece que em 1948 vai para a Rádio América, Record, depois iniciou na televisão na Rede Tupi, Rede Record, TV Globo. No início dos anos 50 era um nome respeitável junto aos grandes valores do rádio, televisão, cinema e teatro. Em 1956, com a companhia de Maria Dela Costa viaja a Portugal, trabalhando em Lisboa nas peças “O Canto da Cotovia” - foi a primeira peça teatral a que eu assisti em minha vida – “Manequim”, “Rosa Tatuada”, conseguindo aplausos da crítica, reportagens em jornais de Portugal. Pequeno resumo de atuações no teatro. Voltando da Europa, trabalha como assistente de direção de Miroel Silveira, no teatro Natal, e logo inaugurou na peça “Um Anjo do Céu”, atuando ao lado de Carlos Zara e Mirtes Grisoli.

"Copacabana S.A.", " O Grande Marido", "Filomena Maturano", com Jaime Costa; "Chuva", "Vivendo em Pecado";" As árvores morrem de pé" e entre outras atuações importantes "Os inocentes" com Dulcina.

No Teatro Brasileiro de Comédias, trabalhou em "A morte do Caixeiro Viajante", "A Revolução dos Beatos" , “Yerma”, "Os Ossos do Barão" e "A Escada".

Foi para o Rio de Janeiro fazer a "Escada" e ficou administrando a Companhia de Rubens Correa e Ivan Albuquerque.

Principais prêmios de teatro, cinema e televisão: Prêmio Moliére de Teatro do ano de 1973 - Air France; Prêmio Associação Paulista dos Críticos de Arte - São Paulo; Prêmio Coruja de Ouro com o filme “Guerra Conjugal” – Embrafilme; Prêmio Governador Estado de São Paulo como melhor Atriz coadjuvante no filme "Guerra Conjugal"; Prêmio Candango - Festival de Brasília com o filme "Contos Eróticos".

Alguns filmes: “Grandes Momentos” - Direção de Roberto Santos; “Quase no Céu” - Direção de Oduvaldo Viana (Pai); “Chuva de Estrelas” - Direção de Oduvaldo Viana (Pai.); “Carnaval em Lá Maior” - Direção de Ademar Gonzaga; “Rebelião em Vila Rica” - Direção de Geraldo Santos Pereira e Renato S. Pereira; “Amor de Perversão – Direção de Alfredo Sterheim; “Guerra Conjugal” - Direção de Joaquim Pedro de Andrade; “Contos Eróticos” - Direção de Roberto Palmare; “Idolatria” - Direção de Paulo Augusto Gomes.

Novelas em televisão de maior sucesso: “Pigmalião 70” - TV Globo; “Minha Doce Namorada” - TV Globo; “Os Ossos do Barão” - TV Globo; “As Locomotivas” - TV Globo; “Sinal de Alerta” - TV Globo; “Ídolo de Pano” - TV Tupi; “A Viagem” - TV Tupi; “Cara a Cara” - TV Bandeirantes; “Pé de Vento” - TV Bandeirantes; “Os Adolescentes” - TV Bandeirantes; “Ninho de Serpente” - TV Bandeirantes; “Meus Filhos, Minha Vida” – Sbt; “O Campeão” - TV Bandeirantes.

Maiores sucessos no teatro ao lado de Paulo Autran e outros nomes de primeira linha do Teatro e TV: “Ossos do Barão”; “A Escada”; “Nossa Vida em Família”; "Mais Quero um Asno que me Derrube", "Assunto de Família" e "As Mulheres".

Falar em Carmem Silva é falar de uma vida inteira consagrada à arte de representar no Rádio, Teatro, Televisão e Cinema.

Carmem é aclamada pela crítica especializada do Rio e São Paulo, como uma das "Damas do Teatro Brasileiro" pelo talento e postura profissional no palco e diante da vida.

Vale salientar que, nos seus trabalhos de teatro, Carmem Silva foi dirigida por grandes diretores brasileiros: Joaquim Pedro de Andrade, Flávio Rangel, Antunes Filho, Ivan de Albuquerque, Elvira Gentil, Kleo Jaez, Jaime Costa, Dulcina de Morais e os diretores de Cinema e Televisão, trabalhos já citados, neste pequeno resumo da vida e da carreira de Carmem Silva.

Há cerca de 10 anos fui visitado pela Carmem Silva - não sei se ela se lembra disso - lá no Departamento Municipal de Habitação, que era também uma fábrica de problemas, teatro do absurdo, e quando me anunciaram a presença da Carmem Silva pensei: “Mais um problema, só que agora com um nome famoso". Mas tudo bem. Ela me veio com a criação de um curso de teatro em Belém Velho, pretendia fazer uma escola para crianças e já queria ir à Restinga dar aulas grátis. Lembro-me de tudo isso porque, como disse e como vou dizer agora, acho que este País precisa de trabalho, precisa de uma série de coisas, mas precisa de otimismo, precisa de garra, precisa de alegria, precisa de gente como a gente que traga para esta Casa, que é o cenário de tantos dramas, de discussão de tantos problemas que tem uma Cidade inchada como a nossa, uma Cidade pobre como a nossa, que recebe todos os problemas do Estado, das periferias, e nós aqui lutamos contra a maré, lutamos contra a correnteza, nós lutamos contra os problemas, é uma Casa às vezes triste, mas no dia de hoje é uma Casa alegre, porque nós podemos entregar, faremos isto ainda hoje, para uma pessoa que dá um orgulho muito grande de privar conosco, uma pessoa que não é de Porto Alegre, mas deu a esta Cidade, tenho certeza, todo o seu carinho, e todo o seu amor. E é isso que nós queremos retribuir no dia de hoje. Muito obrigado pela sua presença. (Palmas.)

 

(Não revisto pelo orador.)

 

O SR. PRESIDENTE: Com a palavra o Ver. Antonio Hohlfeldt, em nome da sua Bancada, o Partido dos Trabalhadores.

 

O SR. ANTONIO HOHLFELDT: Prezado companheiro Ver. Airto Ferronato, primeiro vice-presidente da Casa na Presidência dos trabalhos na tarde de hoje. Minha querida Carmem Silva; prezado Ver. Rafael Santos, como autor da proposição aprovada por esta Casa; Verª Jussara Gauto, sempre Vereadora, cada vez que chegar aqui, cada vez que continua participando das decisões e das brigas e dos desafios dessa Cidade, prezada companheira Judite Dutra, Primeira Dama da Cidade, representando aqui o nosso Prefeito Municipal; Professor Avelino, na representação da Pontifícia Universidade Católica; meus companheiros do Teatro de Porto Alegre, me permito especialmente me representar através da companheira, amiga Sonia Duro, e todos os outros companheiros da Secretaria Municipal de Cultura que aqui se encontram; minhas senhoras e meus senhores. Quero mencionar especialmente o amigo Antonio Freitas, hoje representando a Riocell, que a um determinado tempo deu uma contribuição felicíssima ao desenvolvimento cultural desta Cidade, infelizmente nem sempre reconhecido e preservado. Ao representante do Dep. Tapir Rocha, Sr. Edison dos Santos, que acho que é importante aos nossos deputados que possam participar, representados ou ao vivo, destas homenagens, acompanhando os trabalhos deste Legislativo Municipal; ao companheiro Fernando Gonçalves, representando o Secretário de Recursos Humanos do Estado, um companheiro desta Casa, hoje a serviço do Governo do Estado; minhas senhoras e meus senhores.

Vou seguir um roteiro paralelo ao do Ver. Artur Zanella, que ontem tirou um projeto da esquerda para ele e se não me cuido tira um projeto cultural de mim, que já venho trabalhando nisto há longos anos. Então, não podia deixar de estar aqui presente de nenhuma maneira.

Quero começar relembrando o desafio de que deve ter sido para a Carmem, do ponto de vista individual, familiar, de repente dizer "estou fazendo teatro". Mas, lembrar um outro dado que é a tradição de Pelotas como um Centro Cultural do Estado do Rio Grande do Sul, inclusive na época em que a Carmem começou.

E digo isto não só para contextualizar a figura da Carmem, mas até porque estou sob o impacto da leitura neste final de semana, aproveitando o feriadão, do primeiro volume do Teatro de Simões Lopes Neto. E que, na medida em que homenageamos hoje a Carmem com o Prêmio Qorpo Santo, que é até hoje um grande nome da dramaturgia gaúcha do século passado, eu, pessoalmente, acho que vamos ter que rever a questão da dramaturgia do Rio Grande do Sul em relação a este volume da dramaturgia de Simões Lopes Neto, rever a obra, rever a avaliação do Simões, e, quem sabe, criar, também, um prêmio com o nome de Simões Lopes Neto. E o Prof. Avelino, quem sabe em nome da PUC, pode cuidar disto no sentido de se reavaliar o Simões, num outro aspecto que quase nunca se tocou, que foi a participação de Simões no teatro como autor, às vezes até como ator, junto com sua família, junto com outras pessoas com quem cruzou rapidamente, deixou algum eco na Carmem criança, ou, pelo menos na crônica pelotense das artes cênicas que ela chegou a conhecer, ao menos de ter ouvido falar, ou de ter conhecido gente que participou desta montagem do 7 de Abril, Guarani e outros teatros que em Pelotas apresentavam.

Carmem, acho que a Câmara de Vereadores de Porto Alegre é um dos raríssimos Legislativos, talvez o único Legislativo de Capital que tem esta prática que, além dos títulos habituais de Cidadão Emérito, de Cidadão da Cidade, criou os títulos e homenagens nas artes, Prêmio Érico Veríssimo na Literatura; Prêmio Lupicínio Rodrigues na Música; o Prêmio Qorpo Santo no Teatro, o primeiro homenageado o nosso crítico de Teatro Aldo Obino, certamente teve oportunidade de conviver contigo por muitos anos na Crônica do Correio do Povo. Entre outros homenageados, a Isabel e Arines Ibias, o Ivo Bender e, hoje, a homenagem a ti.

Eu quero deixar um desafio, Carmem, hoje. Você disse que tem planos, eu quero propor um desafio. Eu venho de terminar uma biografia de uma figura feminina, extremamente conhecida, extremamente polêmica e ligada à cultura nesta Cidade. E acho que tu podias fazer a tua própria biografia. É este o desafio que eu queria te propor. Eu acho que tu terias toda uma história dos estilos de representar no teatro brasileiro, atravessaste, ao longo de décadas, de grupos, de companhias, de tendências. Tu terias o que contar dos estilos de representar quanto ao meio, no teatro, na televisão, no cinema, são absolutamente diversos. E, sobretudo, eu acho que tu terias o que falar de uma coisa, neste momento, e eu queria aproveitar esta homenagem, porque eu sei que tu és de briga, para comprar esta briga, está se brigando lá no Congresso Nacional, que são os percentuais obrigatórios de espaço regional nos meios de comunicação. E digo isso, porque toda a semana, pelo menos uma vez, e eu não sou muito de ver televisão, quando eu ligo a TV, rapidamente, está lá no vídeo a Carmem Silva fazendo publicidade. Aposentada, entre aspas, fazendo a sua publicidade. E, certamente, ela faria muito mais, se nós tivéssemos o cumprimento da Lei. É muito bom que nós tenhamos uma emissora de televisão registrando este ato. É muito bom que o jornal, hoje, dedicou uma página inteira a Carmem. Mas seria muito melhor que todas as Rádios deste País, pelo menos as do Rio Grande do Sul, que todas as nossas emissoras de TV cumprissem a legislação dos percentuais dos nossos espaços. E, certamente, a Carmem não estaria aparecendo apenas numa publicidade. A Carmem continuaria aparecendo no teatro do vídeo, fazendo, não a telenovela, que desgasta e certamente diminui o ator, mas a dramatização de textos da grande dramaturgia nacional, internacional e gaúcha no vídeo. Não restrita apenas à TV Educativa, quando o faz, na gravação dos espetáculos, mas produzindo teatro na televisão, como se faz na televisão decente de todos os países do mundo industrializado, na Alemanha, Estados Unidos, Canadá, na França, na Itália, com nossos valores locais. Então, Carmem, eu queria deixar aqui um desafio e uma proposta de luta, à qual tu, certamente, não vais estar ausente. O desafio é este, eu acho que tu tens um compromisso conosco, porque a tua biografia também é a história de um pedaço das artes cênicas deste País. Eu ainda esta semana li a entrevista da Eva Todor, que está em Porto Alegre, com a morte de seu companheiro, e me lembrava que num dos últimos festivais de teatro de Pelotas em que eu estive no júri, a gente discutia o fato de eventualmente, através do Inacem, montarmos uma equipe que fizesse a biografia da Eva, e certamente o companheiro dela teria muito o que contar como produtor de teatro ao longo de anos. De repente, ele morre, a Eva está aí, espero que continue muito tempo, mas, enfim, são destas pessoas que temos a história do nosso teatro: a Eva Todor, a Carmem hoje aqui, e precisamos ter os depoimentos, precisamos ter as histórias, a particular, para conhecermos e homenagearmos, como hoje, mas também a história que é coletiva, que é a história social deste teatro brasileiro, que pouco tem registrado até hoje, apesar dos esforços eventuais quando se encontra num setor oficial, que é um pouco mais dedicado como foi até a ascensão do Governo Collor, através do Instituto Nacional de Artes Cênicas. Este é um lado, e deixo o desafio e a provocação para ti, nesta homenagem; de outro lado, eu acho que esta homenagem também serve a nós, que estamos envolvidos com a cultura, para tomarmos como decisão, e a todos os senhores que nos visitam aqui, uma prática que é comum numa democracia como a americana, de que falamos tanto, e as vezes não a utilizamos, como exemplo nos seus melhores aspectos, é de pressionar o Congresso Nacional, no sentido de que se vote e aprove, urgentemente, o Projeto da Deputada Beth Mendes, no sentido de que realmente a regionalização dos meios de comunicação esteja garantida, ou seja, os percentuais dos nossos atores, dos nossos músicos, dos nossos cantores, dos nossos artistas, enfim, estejam garantidos nas nossas rádios e nas nossas emissoras de televisão. Tenho certeza de que essa seria também uma bela homenagem a transmitir a Carmem neste dia em que se entrega a ela o Prêmio Qorpo Santo.

Carmem, quero te justificar que preciso sair imediatamente, porque, como Presidente da Casa, tenho um compromisso agora para resolver umas questões, como sempre orçamentárias, resolver problemas de dinheiro, para poder continuar a obra deste Plenário e de toda esta Casa. Mas eu queria fazer questão de estar aqui neste momento, para te trazer o abraço, em meu nome pessoal e de meus companheiros do Partido dos Trabalhadores.

No mais, deixar-te aqui com o nosso Presidente dos trabalhos, Airto Ferronato, com o Ver. Zanella, com o Ver. Rafael dos Santos, que continua Vereador, sem dúvida nenhuma, tanto que estamos concretizando aqui um Projeto seu no dia de hoje, com a Verª Jussara Gauto e com todos os Vereadores que sejam bem-vindos aqui nesta Casa, porque esses momentos de reunião são os momentos que nos compensam dentro dos nossos trabalhos, dentro das nossas disputas diárias nos projetos, ideologias e nas idéias diferentes que temos, mas a gente faz uma pausa e se reúne para pensar, juntos, e fazer uma homenagem conjunta. Um abraço a todos, e, especialmente, Carmem, a ti. (Palmas.)

(Não revisto pelo orador.)

 

O SR. PRESIDENTE: Nós concedemos a palavra à Srª Carmem Silva, nossa homenageada.

 

A SRA. CARMEM SILVA: Em princípio, já peço desculpas se eu não usar muito bem a linguagem protocolar, mas é falta de hábito, porque a gente não está muito habituada. Mas eu me dirijo ao Presidente da Mesa, Ver. Airto Ferronato, Sr. Rafael dos Santos meu grande amigo, à Dona Judite Dutra, que eu estou tendo o prazer de conhecer pessoalmente, à Jussara, que já nos conhecemos há muito tempo, me dirijo a todos os presente, estou vendo que temos colegas aqui. Não preciso dizer que estou nervosa; todos estão vendo que eu estou, porque receber um prêmio da terra da gente é muito mais importante do que receber de qualquer outro lugar, de qualquer outro Estado, de qualquer outro País. As palavras do Presidente tocaram exatamente num ponto que eu venho lutando há muito tempo: é a falta de espaço de trabalho para os atores gaúchos. Esse prêmio que eu recebo hoje, eu não quero recebê-lo assim como a Carmem que esteve no Rio, que esteve em São Paulo, que esteve na Europa, que esteve no Uruguai. Não. Este prêmio, eu recebo de coração aberto, mas pelos anos que eu viajei pelo interior do Rio Grande do Sul fazendo teatro. E não só em meu nome; em nome daqueles que morreram obscuros, que desapareceram, que a maioria hoje em dia nem sabe quem são, nem sabem o que eles fizeram. É preciso se fazer uma pesquisa e descobrir aqueles atores antigos que viajavam pelas colônias do Rio Grande do Sul fazendo teatro. Viajávamos em cima de caminhões, sentados nos caixotes de cenário. O caminhão atolava no meio do arroio, vinha uma junta de bois para tirar. Época da guerra nas colônias alemãs, a gente morrendo de medo dos alemães e os alemães morrendo de medo da gente, porque não sabiam quem eram naquele caminhão com caixotes e com pessoas descendo. Mal falavam o nosso idioma. Atolava o caminhão, a gente tinha que dormir em colchão de palha de milho no chão. Era uma complicação terrível. Eu achava delicioso, porque, quanto pior a viajem, melhor eu achava. Eu ficava encantada com aquelas aventuras todas, era uma vida de aventura para mim. Então, aqueles companheiros que morreram como Trajano Vital, o Truvisco, a Eni Vital, mulher dele, os filhos dele são do Conjunto Farroupilha, estes ainda existem, o índio que era ator e cantava também, muitos outros, que eu não lembro o nome de todos, o meu sogro Ribeiro Cancella, o meu marido Carlos Cancella, o Vadico, muito antes de eu ter nome e ser conhecida, o meu marido já era famoso, no entanto, eles morreram completamente obscuros. O meu sogro não, há uma rua com o nome dele, mas meu marido, que era o grande sucesso de Porto Alegre, foi grande sucesso em São Paulo, teve a infelicidade de ficar surdo e, como ele era músico, desapareceu, morreu na obscuridade, porque ninguém mais lembrava dele. Então eu acho que são essas pessoas que não podemos esquecer. Rosa Moreno que está na Casa do Artista é outra coisa que precisamos cuidar. A Casa do Artista precisa de uma atenção maior do povo de Porto Alegre, porque tem uma porção de artistas velhinhos lá, que também trabalharam, Rosa Moreno, essa velhinha que está lá, foi estrela da Companhia do meu sogro, eu ainda não trabalhava e ela já era estrela e sabem junto com quem? O galã dela era o Chico Dantas, o Francisco Dantas, aquele velhinho que atualmente trabalha na Globo, já há muitos anos. Ele era Lituano, chegou no Brasil e em seguida aprendeu português e foi para o palco trabalhar. Então, essas pessoas obscuras, o artista gaúcho não precisaria sair daqui se aqui tivesse uma companhia de Teatro Municipal ou Estatal, os artistas podiam ficar aqui. Por que vai fazer sucesso só quando sai lá para fora? O povo de Porto Alegre também precisa assistir aos espetáculos daqui. Todo o gaúcho que vai prá lá faz sucesso. Por que não fazer este sucesso aqui? E por que não fazermos um intercâmbio de companhias? Se nós aqui recebemos tão bem as companhias que vêm do Rio e de São Paulo, por que que as companhias daqui não têm a mesma aceitação no Rio e em São Paulo, por que não há este intercâmbio de cultura? Isto é que precisa mudar e que há muitos anos falo e luto, mas é tão difícil de se conseguir isto. Outra coisa: programas de televisão. Há mais de 3 anos, desde que vim para cá, luto para fazer um programa na TV Educativa, já pedi, apresentei planos, programa para a terceira idade, um programa de estímulo, para que os velhos trabalhem, criem, isto que quero fazer, mas não consigo. Então, fico aqui em Porto Alegre dando cursos de teatro e faço comercial, e assim vou vivendo. O Presidente disse muito bem que nós precisamos lutar para termos aqui o direito de fazer, gravar, precisamos de um bom teatro, não é só jornalismo. Temos todos os elementos aqui para um bom teatro, como se faz aqui. Têm colegas aqui presentes que assisti a trabalhos deles maravilhosos, como a Lourdes, o Pedro, o Mário Rui, o “Bela Ciao”, uma peça maravilhosa feita aqui com o Pedro. Então, porque não fazemos um teatro grande aqui e um intercâmbio? Nós recebemos as Companhias de Rio e São Paulo e, bem, por que não se educa o povo brasileiro para que o nosso teatro daqui tenha a mesma aceitação que o deles tem aqui? Porque não há diferença em qualidade. Estou muito emocionada e eu não podia perder a oportunidade de falar; esta é a primeira vez que tive. Vou falar uma coisa aqui que talvez as pessoas vão achar triste, mas é a vida.Tudo faz parte da vida. A vida e a morte estão juntas. Se não existisse uma, não existiria a outra. Então, quero fazer um apelo, Dr. Zanella, meu amigo de tantos anos, o que puderem fazer para conseguirem um túmulo para o artista rio-grandense, porque os artistas, muitos destes que eu citei, morreram e ninguém sabe onde foram enterrados, pelo menos que tenha uma chapinha dizendo “aqui jaz o artista fulano de tal”, aí ninguém mais poderá dizer que o artista rio-grandense não tem onde cair morto, aí ele terá um túmulo. Não sei como se faz isso, sou leiga nessa questão de leis, sou simplesmente uma atriz, mas aproveito essa ocasião para falar. Fora isso, o que tenho a dizer é que estou muito emocionada, foi uma homenagem que jamais esquecerei, nos anos que ainda me restam viver, estou com a minha família toda aqui presente, com os meus colegas, com os meus amigos, na minha terra, no meu Estado e o que posso dizer é muito obrigada, muito obrigada, muito obrigada! (Palmas.)

 

(Não revisto pela oradora.)

 

 

O SR. PRESIDENTE: Convido o Ver. Rafael Santos para fazer a entrega do Prêmio de Teatro Qorpo Santo à nossa homenageada, Srª Carmem Silva.

 

(O Ver. Rafael Santos procede à entrega do prêmio à homenageada.) (Palmas.)

 

O SR. PRESIDENTE: Senhoras e senhores, informamos que esta Casa recebeu dois telegramas parabenizando a atriz Carmem Silva pelo prêmio tão bem merecido: telegrama de João Gilberto Lucas Coelho, Secretário de Ciências e Tecnologia do Estado do Rio Grande do Sul e Vice-Governador do nosso Estado. Recebemos, também, nesse mesmo sentido, telegrama do Dr. Adroaldo Loureiro, Secretário de Estado do Trabalho, Ação Social e Comunitária.

Ilustres componentes da Mesa, autoridades presentes, senhoras e senhores. Em nome da Mesa da Câmara Municipal de Porto Alegre e em nome de todos os Vereadores desta Casa, cumprimentamos a nossa homenageada, Srª Carmem Silva, registramos e agradecemos a presença de todos e damos por encerrados os trabalhos da presente Sessão.

Estão levantados os trabalhos.

 

(Levanta-se a Sessão às 18h05min.)

 

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